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Pesquisa, Extensão e Aprendizagem Participativa

Clístenes Antônio Guadagnin

07 / 2010

No meio rural de Santa Catarina, métodos e estratégias participativas de ensino, pesquisa, extensão e desenvolvimento foram implementados através das ações do projeto Microbacias 2 (MB-2), compondo o processo de Pesquisa, Extensão e Aprendizagem Participativa (PEAP). O objetivo é oportunizar e desenvolver as capacidades locais de “aprender a aprender” e desta forma lidar com qualquer questão ou tema que possa limitar a possibilidade de desenvolvimento sustentável de uma comunidade ou território, tendo a participação coletiva como elemento chave de todo o processo. Os avanços positivos deste processo são percebidos com o aprendizado coletivo e a construção social de conhecimentos que fortalecem as capacidades territoriais de lidar com situações complexas e incertas, vivenciadas pelos agricultores familiares e contribuem para a melhoria da qualidade de vida das famílias rurais, com avanços no contexto social, econômico e ambiental.

Introdução:

A Pesquisa Participativa envolve processos educativos desenvolvidos de forma coletiva e tem como princípios: a construção de novos conhecimentos, a tomada de decisões conjuntas, a conscientização da realidade vivenciada, o conhecimento das possibilidades reais e concretas de encontrar caminhos de solução para problemas comuns, a definição de prioridades que serão objeto de trabalhos e a motivação para a ação. As estratégias de ação da Pesquisa Participativa fundamentam-se no Método Paulo Freire baseados na investigação, tematização e problematização.

A partir dos anos oitenta, com a concepção da sustentabilidade, a participação se tornou um conceito altamente popular e pré-requisito para projetos que almejavam apoio de entidades financiadoras. Conseqüentemente, vários modelos participativos de pesquisa e extensão rural foram formulados e experimentados neste período. No meio rural de Santa Catarina, diferentes estratégias têm sido propostas visando a implementação de métodos participativos nas ações de ensino, pesquisa, extensão e desenvolvimento, tendo como um exemplo importante as ações do projeto Microbacias 2 (MB-2), que tem reforçado a necessidade da participação nas ações de desenvolvimento (Pinheiro & De Boef, 2007).

A participação, como metodologia e concepção de trabalho é uma alternativa ao modelo produtivista que causou o afastamento dos agricultores dos processos de geração e adaptação de tecnologias. Através de metodologias participativas se busca mecanismos para compreender as situações complexas e diversas nas quais operam os agricultores, sobretudo na agricultura familiar, além de recuperar e introduzir os saberes e conhecimentos locais ou tradicionais na geração de tecnologias que contribuam à sustentabilidade, sem desprezar o conhecimento científico ou tecnológico (EMBRAPA, 2002).

Com a efetivação das ações do projeto MB-2, a partir de 2005, um grupo de pesquisadores, extensionistas, professores e técnicos de diversas formações e instituições públicas e da sociedade civil organizada, além de profissionais autônomos, foram convidados a formarem equipes multidisciplinares e interinstitucionais em cada região do Estado. A realização de seminários abrangendo os temas: conceituação e metodologias participativas; diagnósticos, entendimento da realidade, desafios e oportunidades locais; desenho e elaboração de projetos com parceiros locais permitiu ao grupo definir essas ações como “Pesquisa, Extensão e Aprendizagem Participativa”.

Experiências de Pesquisa, Extensão e Aprendizagem Participativa em Santa Catarina

O desenvolvimento de trabalhos de Pesquisa, Extensão e Aprendizagem Participativa (PEAP), realizados em Santa Catarina desde 2005, foi proposto pela EPAGRI através do componente Pesquisas e Estudos do projeto MB-2 com a implementação de 10 projetos-piloto realizados nas diferentes regiões do estado. Os temas e produtos inicialmente investigados nestes projetos-piloto foram apenas motivadores de cada processo, no sentido de fortalecer as comunidades rurais na construção social de conhecimento em parceria com outros atores. O objetivo deste processo é oportunizar e desenvolver as capacidades locais de “aprender a aprender” e desta forma lidar com qualquer questão ou tema que possa limitar a possibilidade de desenvolvimento sustentável de uma comunidade ou território.

Em Guaraciaba/SC o projeto piloto teve como tema: “Resgate do saber local envolvendo o manejo de solos e a melhoria da produção de leite a base de pasto nas Associações de Desenvolvimento das Microbacias (ADMs) Rio Flores e Lajeado Ouro Verde”. Esse projeto envolveu famílias de agricultores das ADMs, 5 famílias de agricultores experimentadores, professores universitários, técnicos facilitadores do Projeto MB-2, extensionistas locais e pesquisadores da Epagri e estimulou a integração entre os pessoas deste grupo para a resolução de problemas demandados pelas comunidades através de estratégias participativas. Todas as etapas do trabalho e decisões foram realizadas conjuntamente.

A partir dessa experiência de PEAP diversas outras ações foram praticadas. Devido ao interesse de famílias de agricultores em avaliar aspectos agronômicos das variedades locais existentes entre os agricultores, com o apoio da equipe local da EPAGRI e MB-2, surgiu a idéia de desenvolver unidades de observação e pesquisa participativa com variedades locais de arroz de sequeiro, com as sementes de diversas variedades mantidas entre os agricultores da região. Foi desenvolvida no ano de 2005 uma unidade de pesquisa participativa com 14 variedades de arroz na propriedade da família do agricultor Leonildo Schmitz da Linha Tigre, onde no momento da colheita realizou-se uma tarde de campo com grande repercussão na comunidade e região, inclusive com a participação de agricultores e técnicos de outros municípios. Também foram conduzidas unidades de observação do uso de pó de basalto visando identificar as potencialidades do uso alternativo de fontes de nutrientes para as pastagens destinadas à bovinocultura de leite. Posteriormente foram desenvolvidas unidades de observação e pesquisa com o uso de adubos verdes de inverno e de verão, ensaios com variedades locais de milho, milho pipoca e feijão com a participação de pesquisadores do NEABio/UFSC e EPAGRI/CEPAF de Chapecó, que estimularam trabalhos semelhantes em outros municípios da região.

Essas ações de pesquisa participativa aliadas aos trabalhos desenvolvidos pela equipe local formada por extensionistas da EPAGRI e facilitadores do projeto Microbacias envolvendo temas como a produção de alimentos saudáveis para o auto-consumo das famílias, a redução do uso de agrotóxicos, a conservação da agrobiodiversidade, a redução de custos de produção, a valorização dos conhecimentos locais ou tradicionais incentivaram a criação do denominado “Kit Diversidade”, que é um conjunto de sementes produzidas e distribuídas entre as famílias de agricultores associadas às Associações de Microbacias. Uma das constatações mais surpreendentes deste trabalho foi que 75% das famílias associadas à esta ADM que revelaram não plantar mais o arroz para o seu consumo no ano de 2004 e após essas ações esse quadro se reverteu de modo que 60% das famílias retomaram o hábito de produzir o arroz para o seu auto-consumo.

O aprendizado coletivo e a construção social de conhecimentos fortalecem as capacidades territoriais de lidar com situações complexas e incertas, vivenciadas pelos agricultores familiares com mais dificuldades sócio-econômicas e menos favorecidos pelas ações convencionais de pesquisa, ensino, extensão e desenvolvimento rural. Estes processos facilitam as comunidades a “aprender a aprender”, a dialogar e a ampliar suas oportunidades. Os avanços verificados destas ações contribuem para a melhoria da qualidade de vida das famílias rurais, com avanços no contexto social, econômico e ambiental.

Palavras-chave

pesquisa participativa, agricultura familiar, desenvolvimento rural


, Brasil

dossiê

Kit Diversidade: Estratégias para a Segurança Alimentar e Valorização das Sementes Locais (Guaraciaba, Santa Catarina, Brasil)

Notas

Este artigo faz parte de capítulo do livro Kit Diversidade: Estratégias para a Segurança Alimentar e Valorização das Sementes Locais. Organizado por Adriano Canci, Antônio Carlos Alves e Clístenes Antônio Guadagnin (2010). Editora Gráfica McLee - São Miguel do Oeste-SC- Brasil

Fonte

Refêrencias:

EMBRAPA. Pesquisa Participativa. Disponível em: www.scribd.com/doc/18823140/02-Pesquisa-Participativa. Acesso em: 19 mar. 2010.

PINHEIRO, S.; DE BOEF, W.S. Pesquisas participativas “para” e “com” comunidades rurais: Caminhos diferentes para a construção socio-ambiental de conhecimentos agroecológicos. Revista Brasileira de Agroecologia. v. 2, n. 2, p. 398-401, out. 2007.

menções legais