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diálogos, propuestas, historias para uma cidadania mundial

Não Matem Nossas Crianças

Mabel Solange CAVALCANTI

06 / 1996

Era uma vez uma criança que ao nascer, recebeu um rótulo cinzento, cheirando a poeira e falta de esperança, que o sistema intitula de POBRE atestado de insuficiência numa sociedade onde se vale pelo que se podemos acumular materialmente.

Esta criança, sem brinquedos, sem perspectivas, vive próxima ao lixo da favela e quando, vez por outra, visita o "mundo civilizado" em busca de alimentos, nem se dá conta que esse mundo volta os olhos à informatização de suas riquezas, deixando-a a contemplar os muros da cidade que, pixados de uma cor escura, trazem uma triste marca que ela pouco entende: "não matem nossas crianças".

O evolvimento com drogas, com prostituição, misturando a falta de afeto e indiferença tornou-se uma constante em seu cotidiano, procurado pela escola essa criança envolveu-se em várias tentativas de resgate à sua cidadania, mas acabou cedendo aos "atrativos" do mundo que vive, tornando a escola impotente em seu projeto de tentativa de resposta ao sistema que está aí.

As histórias que se contam são assustadoras. Uns afirmam que essa criança chefia uma gang na favela. Que assalta e faz o tráfico de várias drogas. Outras juram que o pequeno consegue fugir da polícia como por encanto, driblando a própria sorte em busca de sobrevivência.

As justificativas são inúmeras: é fruto do sistema! Mais um marginal assaltando na favela! Que destino trouxe essa criança.

Que destino trouxe essa sociedade que, doente pelo poder, cria um sistema deacúmulo de riquezas e deixa ao descaso a situação de fome, miséria e falta de moradia onde se encontra a maioria da população brasileira.

Esse pequeno fruto das desigualdades sociais é uma criança, um menino, com sonhos fantasias, resultado da injustiça em que se encontra o país,que não precisa do julgamento hipócrita da sociedade, mas da ajuda e solidariedade de seus cidadãos.

Muito me indigna a "condição de vida" dessa criança, a falta de esperança com que prepara seu futuro, muito me assusta a crescente violência que permeia o submundo das favelas, muito me revolta a omissão e a cobiça dos poderosos que, trancados em seus gabinetes ou perdidos em maravilhosos passeios em carros de luxo, planejam visitas à favela em troca de votos com falsas promessas.

o problema social é angustiante, e nele estamos todos inseridos, presos nas favelas urbanas desencantados com nossa própria força, estarrecidos diante de tanta impunidade, pixando os muros em busca de ajuda para nossas crianças, para nós mesmos, lutando nas, muitas vezes, impotentes pastorais da vida.

Algo precisa ser revisto, empunhado como bandeira de luta. Hoje é o menino da favela, amanhã são nossos filhos. Somos todos vítimas e parece que contemplamos calados tanta violência.

O destino está traçado! Não por Deus, mas por quem, diante de tudo se cala ou prepara discursos demagógicos na busca desenfreada do poder.

Enquanto isso, Everton Anderson da Silva, renuncia a brinquedos e sonhos e agoniza no hospital atingido na cabeça por um companheiro da favela. Atingido pelo sistema, ferindo nossa condição humana, entregue a própria sorte.

Que a terra seja leve aos poderosos!

Palavras-chave

educação popular, educação, pobreza


, Brasil, Pernambuco

Notas

Através do insentivo à produção e leitura de fichas de capitalização de experiências pedagógicas, a rede BAM pretende favorecer a um processo de formação continuada junto a coletivos de educadores de jovens e adultos (hoje, existentes nos estados do Rio de Janeiro e Pernambuco). Está apoiado numa metodologia que valoriza a autoria e promove a interação entre educadores de diferentes contextos.

Fonte

Texto original

SAPÉ (Serviços de Apoio à Pesquisa em Educaçào) - Rua Evaristo da Veiga, 16 SL 1601, CEP 20031-040 Rio de Janeiro/RJ, BRESIL - Tel 19 55 21 220 45 80 - Fax 55 21 220 16 16 - Brasil - sape (@) alternex.com.br

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